sábado, 9 de outubro de 2010

Sábado recordação


Jards Macalé

Conhecido como Macalé, mas é Jards Anet da Silva, ou "da Selva", como declama no admirável Aprender a Nadar. Um carioca da Tijuca, nascido a 3 de março de 1943, ao pé do Morro da Formiga. Nasceu rodeado de música: no morro, os batuques; no vizinho, Vicente Celestino e Gilda de Abreu. E em casa, os foxes, as valsas e as modinhas tocadas pela mãe, dona Lígia, ao piano; o pai no acordeom; o coro familiar com Roberto (irmão caçula) e Jards. E no rádio, Orlando Silva, Marlene, Emilinha.

Aos oito anos, Macalé foi morar em lpanema. No intervalo das dificuldades com as tarefas da escola, feitas na marra - com o pai, oficial da Marinha, ao lado -, Jards jogava futebol na praia. Jogava mal. E ganhou o apelido de Macalé, homenagem ao pior jogador do Botafogo na época.

Em Ipanema, ainda a música na vizinhança: a amizade com Chiquinho, filho de Severino Araújo (maestro da Orquestra Tabajara) e as idas às rádios Nacional e Mayrink Veiga. Foi o maestro que lhe mostrou maracatus, frevos, sambas-canções, jazz, blues, sambas e choros.

Havia também os festivais da juventude no Cine Rex com a madrinha (Dinda) ou com o pai. Depois, um porre de cinema no Cineac, de onde o menino só saía arrastado: Chaplin, Max Linder, Irmãos Marx, Buster Keaton.

No violão começou de espia, na carona das aulas da vizinha Marilena. Ficava assistindo e depois pedia o violão emprestado, repetia as posições.

Chiquinho Araújo tocava bateria e resolveu formar com Macalé o conjunto Dois no Balanço, em 1959. Com a vinda de novo companheiro, o conjunto virou Três no Balanço; e de um em um chegaram a Seis no Balanço. "Conjunto fantasia de garoto", tocando jazz, seresta, samba-canção até altas madrugadas.

Depois veio a bossa nova e a descoberta do violão de João Gilberto, novo para o Seis no Balanço, que existiu até 1963.
Macalé fazia alguns arranjos e começou a compor: Tristeza em Canção ("Vê, a chuva vem e faz / Quem não chorou chorar / (...) / E o vento vem e traz tristeza em canção / (...) / E eu sozinho não sei mais, não sei quem sou") é de 1959.

Duda, um dos primeiros parceiros de Macalé, conhecia Torquato Neto, que conhecia Jota Piauiense, que conhecia Caetano Veloso, que ficou sabendo dos Seis no Balanço e que os visitou em pleno ensaio, num dia de 1962. Foi o suficiente. A amizade criou a ponte Rio - Bahia, por onde viajavam as informações. Até que veio o convite para Macalé estudar música em Salvador. Mas sair de casa era um feito heróico, não realizado. As malas prontas, Jards ficou no Rio mesmo.

niciou a carreira profissional em 1965, substituindo Roberto Nascimento no violão junto ao Grupo Opinião; depois veio Arena Conta Bahia, também em 1965. Em 1966 já fazia a direção musical do Recital, de Bethânia, no Rio. Foram muitos espetáculos, Macalé ao fundo, seu violão, sua cara de menino sério. A extrema timidez.

Em 1967 o tropicalismo começava a se caracterizar e Macalé se decidia pelo estudo de música: piano, orquestração (com Guerra Peixe), violoncelo (com Peter Daulsberg), análise musical (com Ester Scliar), violão (com Turíbio Santos e Jodacil Damasceno), composição (na Pró-Arte).

Assistiu de perto ao desenvolvimento do tropicalismo. Embora fosse muito amigo dos baianos e mesmo confundido com eles, sua participação se resumiu a discussões domésticas. Nunca assumiu a postura rotulada. Continuava o trabalho, trocava experiências, acompanhando tudo. Em 1968 começou a compor ao lado de Antônio Carlos Capinam e foi ganhando o gosto de cantar.