quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
Câmara dos Deputados faz devolução simbólica dos mandatos cassados pela ditadura militar
Em sessão solene da Câmara dos Deputados, no dia 6 de dezembro, às 15h, serão devolvidos simbolicamente os mandatos populares cassados pela Ditadura de 1964. Em seguida, será inaugurada a exposição Parlamento Mutilado:
Deputados Federais Cassados pela Ditadura de 1964 e lançado livro homônimo sobre os fatos daquele período.
As atividades são de iniciativa da Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça, criada no âmbito da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, para homenagear os 173 deputados federais cassados por atos de exceção entre 1964 e 1977.
A exposição a ser aberta oficialmente no corredor entre o edifício principal e os anexos da Câmara, é composta de imagens que retratam os momentos mais tensos vividos no Congresso Nacional entre 1964 e 1985, além de fotografias recolhidas no acervo do Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados. Abre a exposição o impressionante painel A verdade ainda que tardia, do renomado artista plástico Elifas Andreato, que compôs uma visão sobre a repressão e a resistência dos Anos de Chumbo.
O livro contém uma reunião de informações até então esparsas sobre todos os 173 deputados cujas representações foram retiradas sem o devido processo legal. As cassações estão divididas entre as quatro legislaturas atingidas e analisadas em seu contexto político. Os autores da obra são os consultores legislativos da Câmara dos Deputados Márcio Rabat e Débora Azevedo.
Durante o período ditatorial, o Congresso Nacional teve suas prerrogativas usurpadas, tendo sido fechado em três momentos por forças do regime instaurado com o golpe militar de 1964.
A restituição, ainda que simbólica, da dignidade dos mandatos é devida pela Câmara dos Deputados como instituição que teve suas portas fechadas e prerrogativas subtraídas. Afirmar a soberania do Legislativo, apurar as violações de direitos humanos perpetradas contra parlamentares e servidores, reconhecendo os esforços de resistência democrática de todos, é um dever a resgatar.
Contribuição para resgate da memória e verdade
Com as três atividades que marcam a devolução simbólica dos mandatos, a Câmara dos Deputados marca sua participação no processo de resgate da memória e busca da verdade histórica sobre aquele período, com vistas à consolidação da democracia no país.
O projeto composto da devolução simbólica dos mandatos, da exposição e do livro, foi concebido no âmbito da Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça (denominação de subcomissão criada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados) em dezembro de 2011.
O colegiado parlamentar foi criado para se somar ao trabalho da Comissão Nacional da Verdade, instituída pela Lei nº 12.528/2011, no poder Executivo, e às iniciativas da sociedade civil, como os comitês populares em vários estados, universidades e organizações profissionais.
A Comissão Parlamentar da Verdade, como se convencionou chamar, atuou compartilhando os resultados de suas atividades, inclusive as informações e documentos reunidos pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias no decorrer de toda sua trajetória, iniciada em 1995, sobre as violações cometidas por agentes do Estado no período de exceção de 1964-1985.
A Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça
A Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça tem realizado seminários, audiências públicas e diligências com a finalidade de recolher e partilhar informações, experiências e angústias das vítimas da ditadura, contribuindo, assim, com o efetivo resgate da verdade histórica.
Articulou a criação da Rede Parlamentar Nacional de Direitos Humanos, junto a comissões da área nas assembleias legislativas e câmaras municipais, a partir de um encontro que debateu o conceito e o papel do parlamentar para a memória, a verdade e a justiça, estimulando ações nas esferas estadual e municipal.
Com a parceria do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, realizou um ato público de homenagem aos advogados dos presos políticos, em 13 de novembro de 2012. Avaliou, num seminário internacional sobre a Operação Condor, essa articulação das ditaduras no Cone Sul, apoiada pelos Estados Unidos da América, com a presença de estudiosos e militantes de todos os países envolvidos: Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Bolívia e EUA.
Contribuir para desvelar casos ainda obscuros, como o massacre de indígenas e camponeses, tomar depoimento de ex-agentes da ditadura sobre sequestros, torturas e execuções - sempre com a parceria do Ministério Público Federal - também se destacaram entre as ações da Comissão Parlamentar da Verdade em seu primeiro ano de atividade.
Lembrar para não repetir o passado
É preciso lembrar até para não repetir o passado, pois se hoje usufruímos a normalidade democrática, com acesso aos direitos inerentes à cidadania, muitos homens e mulheres tiveram de resistir, lutar, arriscando suas próprias vidas e sua segurança pessoal diante de uma ditadura que não hesitou em impor a censura e cancelar direitos políticos e civis, banir do país, infligir a tortura, executar sumariamente e ocultar corpos de opositores políticos. Somente a ausência da democracia nos dá a dimensão da importância de sermos livres.
A cassação de um mandato, sem o devido processo legal, mas como ato de uma ditadura, não atinge somente um deputado ou sua corrente política. É a representação que está sendo subtraída violentamente do próprio povo.
Ao lado de militantes conhecidos ou anônimos, que lutaram nos movimentos sindical, estudantil, da igreja, membros das forças armadas que resistiram contra o golpe e o arbítrio, muitos parlamentares resistiram e se somaram na conquista da anistia dos perseguidos políticos (ainda que manipulada pelo governo da época, que incluiu seus criminosos de lesa-humanidade entre os beneficiários), os direitos de organização, as eleições diretas, até a Constituinte de 1986/1988, que completou o ciclo da redemocratização.