terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Parlamentarismo já!

Parlamentarismo é um sistema de governo em que o poder legislativo (parlamento) oferece a sustentação política (apoio direito ou indireto) para o poder executivo. Logo, o poder executivo necessita do poder do parlamento para ser formado e também para governar. No parlamentarismo, o poder executivo é, geralmente, exercido por um primeiro-ministro (chanceler). Vantagens A vantagem do sistema parlamentarista sobre o presidencialista é que o primeiro é mais flexível. Em caso de crise política, por exemplo, o primeiro-ministro pode ser trocado com rapidez e o parlamento pode ser destituído. No caso do presidencialismo, o presidente cumpre seu mandato até o fim, mesmo havendo crises políticas. No momento atual, em que a crise econômica encontrou a crise moral, experimentamos crescente desconfiança nas instituições de governo, algumas das quais demonstram claros sinais de esgotamento, sendo a principal delas o sistema de governo presidencialista. O chamado “presidencialismo de coalizão”, praticado em nosso país, guarda semelhança com um carro beberrão que, a despeito de levar seu proprietário ao destino desejado, impõe custos altíssimos a ele e à sociedade como um todo na esfera ambiental. Tal qual o automóvel, o sistema presidencialista conduz o governo, mas impõe seus custos políticos. Além disso, é possível inferir, com base em nossa história republicana, que o presidencialismo falha quando é confrontado com situações de crise, diante da rigidez temporal dos mandatos concedidos ao Poder Executivo e Legislativo, gerando crises que já culminaram em morte, renúncia, golpe e impeachment. Começando pela própria renúncia do marechal Deodoro, passando pelo trágico suicídio de Getúlio, pela renúncia de Jânio e pelo golpe em Jango, culminando no impedimento de Collor. Todos esses episódios demonstram um esgotamento da capacidade do Executivo de continuar a governar o país, a despeito de o mandato das urnas ainda não se haver completado. Ora, o momento que atravessamos nestes primeiros cem dias do segundo governo de Dilma Rousseff é exatamente dessa natureza. Dilma não tem mais capacidade de governar – terceirizando a economia a Levy e a política ao PMDB –, mas ainda dispõe de mais três anos e meio para terminar o mandato, conferido a ela pelos eleitores em outubro de 2014. O momento exige que passemos as instituições a limpo e reconheçamos que o presidencialismo não nos faz bem no que diz respeito à qualidade de nossa democracia. Em primeiro lugar, pelo caráter excessivamente personalista que imprimimos ao regime, fruto de nossa cultura política ancestral e agravado pelo messianismo de algumas lideranças e por algumas outras instituições presentes em nosso sistema político. Em segundo lugar, pela própria ausência de um mecanismo como o voto de desconfiança que, em casos de crise, é apreciado pelo parlamento a fim de interromper o agravamento da situação. Caso o voto de desconfiança obtenha a maioria dos parlamentares, cabe ao Chefe de Estado, seja ele um presidente ou monarca, dissolver o governo e devolver o poder ao seu legítimo dono – o povo –, que se manifestará por meio de novas eleições. Curiosamente, três argumentos recorrentes fazem com que a discussão sobre o parlamentarismo seja relegada ao segundo plano em nosso país, fazendo com que forças políticas relevantes com DNA parlamentarista – como o PSDB – se omitam, quase que de maneira envergonhada, de empunhar tal bandeira. O primeiro deles diz respeito ao fato de que, durante o plebiscito de 1993, a maioria da população decidiu pelo regime presidencialista. O argumento é válido, mas cabe o questionamento: será que deveremos nos prender eternamente a uma revisão constitucional realizada apenas cinco anos após a promulgação da Carta de 1988? A perspectiva de quase trinta anos de presidencialismo e os escândalos que são lançados diuturnamente em nossa imprensa não são suficientes para que repensemos algumas decisões tomadas? Se há pessoas e partidos que defendem inclusive o fim da reeleição – esta aprovada mais tarde, em 1997 –, por que não rever o sistema presidencial? O segundo argumento estaria ligado ao fato de que, adotado o parlamentarismo, a população teria usurpado o direito de escolher o chefe do governo, resignando-se à escolha de partidos, o que poderia ser traduzido como diminuição de direitos políticos conquistados no fim do ciclo autoritário. Essa é uma ideia pueril, dado que ao invés de retirar quaisquer direitos, o parlamentarismo dota os cidadãos de um poder maior, uma vez que a decisão é sobre uma agenda partidária e não sobre uma figura, por vezes carismática, cuja plataforma acaba em segundo plano. Além disso, o voto de desconfiança faz com que a população se manifeste – por meio das urnas – com a seriedade devida nos momentos necessários e não como um ritual vazio praticado periodicamente, entendido por alguns como mera formalidade. Um terceiro ponto liga a péssima escolha de nossos representantes para o Legislativo ao temor de que figuras como Eduardo Cunha ou Renan Calheiros controlem um sistema como esse. Aqui, o problema desta crítica é tomar o efeito pela causa: as más escolhas independem do sistema, ocorrendo no presidencialismo e podendo ocorrer no parlamentarismo. Votar corretamente exige algum grau de conhecimento da política e de disposição para pesquisar bons candidatos, participando da fiscalização de seus mandatos. O mérito do sistema parlamentarista, neste caso, seria de tornar as eleição para o Poder Legislativo mais significativas para o eleitor, fazendo com que ele não desdenhe de suas escolhas para este poder na medida em que compreender que a maioria do Congresso Nacional chefiará o governo. Por tudo isso, é chegada a hora de enfrentarmos a questão da implantação do Parlamentarismo, sob pena de hipotecarmos uma questão maior: a da Democracia.